O potencial encarecimento dos livros no mercado brasileiro na esteira da reforma tributária gerou alertas públicos e mobilizou, nas últimas semanas, diferentes segmentos dessa cadeia produtiva, aparentemente com sucesso já que a futura Contribuição de Bens e Serviços (CBS) não deverá incidir sobre esses itens.
Mas ainda existe o risco de que não só livros mas também jornais, revistas e periódicos fiquem mais caros, caso avance a proposta de reforma que prevê a extinção do papel isento de impostos, o chamado papel imune.
Se o papel, matéria-prima para a confecção de produtos editoriais, for onerado, haverá impacto em toda a cadeia, alerta a indústria gráfica. “Se a imunidade cair, o preço final [de todos os produtos editoriais] subirá de 20% a 30%”, diz Levi Ceregato, presidente da Associação Brasileira da Indústria Gráfica (Abigraf) Nacional e do Comitê da Cadeia Produtiva do Papel, Gráfica e Embalagem da Fiesp (Copagrem). “Neste momento, o esforço deveria ser o de priorizar a cultura e sobretudo a educação, e não tratá-las como produtos supérfluos”, aponta.
A extinção do papel imune, instituído pela Constituição de 1946 com o objetivo de fomentar a educação e a cultura no Brasil, foi recomendada em parecer pelo senador Roberto Rocha (PSDB-MA), relator da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 110 - uma das duas PECs que versam sobre a reforma tributária.
Em sua justificativa, o senador diz que a falta de controle efetivo sobre as transações com papel imune gera desequilíbrio concorrencial e a própria indústria gráfica brasileira teria alegado que sofre “graves prejuízos” decorrente de fraudes, conforme exposto em um dos cinco estudos comparativos sobre a reforma tributária disponibilizados pela Câmara dos Deputados.
Mas o pleito de extinção do papel isento de impostos não partiu da Abigraf, entidade que representa 90% da indústria no país e foi surpreendida pela iniciativa do senador. O setor reconhece que o desvio de finalidade - o uso de papel isento de impostos para outros fins que não os previstos na Constituição - ainda é um problema, embora a fiscalização tenha evoluído bastante na última década, mas é contrário ao fim da imunidade.
Por ano, são movimentadas mais de 1 milhão de toneladas de papel isento de impostos no país, comparável a um consumo aparente (considerando-se todos os tipos de papéis, incluindo embalagens e de higiene) de 9 milhões de toneladas em 2019. O volume movimentado, portanto, é relevante e as fraudes crescentes levaram à implantação do Sistema de Registro e Controle das Operações com Papel Imune (Recopi), programa que já trouxe resultados importantes.
Para a Abigraf, tributar o papel usado na impressão de livros, revistas, jornais e periódicos representa um “retrocesso que pode elevar significativamente o preço final destes produtos, dificultando o acesso de milhões de brasileiros à cultura, educação e informação de qualidade”. Além disso, elevaria gastos do próprio governo, que todos os anos compra milhares de livros por meio do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD).
Entidades do setor livreiro, entre as quais Sindicato Nacional dos Editores de Livros (Snel) e Câmara Brasileira do Livro (CBL), se manifestaram publicamente contra a tributação dos livros, com apoio de associações que estão na cadeia produtiva do papel, incluindo a indústria gráfica, e conseguiram sensibilizar o Legislativo. Agora, a expectativa é a de que o alerta sobre o papel imune também leve à revisão dos termos propostos para a matéria-prima dos livros.
Fonte: Valor Econômico 29.09.2020
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