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  • Foto do escritorFabrizio Caldeira

Produtor rural pessoa física e igualdade legal para fins tributários como PJ

Bobbio leciona em sua “Teoria Geral da Política” que a junção entre lei e justiça passa pela igualdade, sendo que como elo fortalecedor desse pressuposto, desde “Nomoi, de Platão, aos Esprit des lois, de Montesquieu, passando pelos tratados De legibus de Cícero e de Suárez”, firmou-se o entendimento de que as normas devem ser endereçadas a uma multiplicidade de sujeitos, tendo “por objeto uma classe de ações.” [1]


Afirmamos ser atual a doutrina assentada pelo renomado filósofo italiano, em especial para a matéria que a seguir será apresentada, continuidade que é a texto anterior publicado sob o título: “Foi o produtor rural pessoa física lançado ‘às garras’ do Fisco?” [2], no qual fizemos um alerta sobre os impactos de natureza tributária que deverá sofrer o produtor rural pessoa física, inclusive retroativamente, dado o recente posicionamento do STJ em recurso especial manejado em autos de Recuperação Judicial de produtor rural pessoa física equiparado a empresário pessoa jurídica.


E nesse trilhar seguimos, agora com foco no reforço de que os aspectos e impactos de ordem tributária devem ser considerados pelo produtor rural pessoa física; uma vez que passará esse da condição de contribuinte pessoa física para jurídica, afeto a todos os reflexos tributários dessa alteração, sujeitando-se à coleta e cruzamento de seus dados fiscais pela Receita Federal do Brasil, para a apuração de diferenças de tributos a pagar dada a essa nova condição de sujeito passivo tributário.


Tal condição de realocação de condição e sujeição jurídica – de pessoa física para jurídica -, dá-se em expressa observação à igualdade de ‘status’ perante as normativas tributárias vigentes, confirmando as citadas lições de Bobbio.


Pois bem, dizemos mais! Para aqueles que também tem a pretensão de submeter sua reorganização administrativa e financeira ao Poder Judiciário, no campo legislativo encontra-se em tramitação proposta modificativa à Lei nº 11.101, de 2005, reguladora da “recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária”; sendo que em recente sessão plenária da Câmara dos Deputados e para a leitura do Projeto de Lei nº 6229, de 2005, relatado pelo deputado federal Hugo Leal, entre tantas Emendas destacou-se a de número 02 (dois), tendo por objeto desconsiderar como receita tributária em Recuperação Judicial “as contrapartidas positivas apuradas em razão do abatimento de dívida decorrente de plano de recuperação extrajudicial ou judicial e seus reflexos no resultado.” [3]


A referida proposta de Emenda foi rechaçada pela relatoria do projeto legislativo em questão sob o fundamento de que

“seus reflexos no resultado, contém uma importante questão fiscal que, a nosso ver, afeta diretamente o art. 14 da LRF (Lei Complementar nº 101/2001), por conter uma renúncia fiscal, na medida em que permite uma possibilidade de renúncia de receita”


Tal renúncia de receita pretendida pela proposição de Emenda ao texto em votação foi corretamente afastada, também aqui em vital reconhecimento da necessidade de igualdade de sujeitos perante as leis fiscais e orçamentárias.


Importante destacar que, ao rechaçar a desconsideração como receita tributária e firmar que tal medida permitiria renúncia de receita, a Câmara dos Deputados, ao aprovar o texto, confirmou a incidência de tributação sobre tais contrapartidas positivas, e assim, sujeitando planos de recuperação já aprovados e novos, a inexoravelmente oferecer referidas receitas a tributação. E esta consideração é feita porque há muita discussão doutrinaria tributária e contábil a tal respeito, que ora parece se dissipar.


Não só isso! O mesmo Projeto de Lei nº 6229, de 2005 [4], relatado pelo deputado federal Hugo Leal, ao autorizar o ingresso em Recuperação Judicial ao produtor rural pessoa física estabelece isonomia legal aos demais autorizados a acessar referido instituto, como empresário rural que se tornará, colocando-o em igualdade comercial, cível, empresarial, trabalhista, previdenciária e tributária com as demais pessoas jurídicas empresárias sujeitas à proposta legislativa, inclusive perante os competentes órgãos de fiscalização da Administração.


Não fosse isso e era o menos, não fosse tanto e era quase” [5] é a complexa e pura reflexão concreta que reclamamos do produtor rural pessoa física alcançado tanto pelo atual posicionamento do STJ quanto pelo antes citado Projeto de Lei, pois se nefastos lhe parecem ser o peso das dívidas acumuladas, decorrentes de (i) possível quebra de safra ou até a (ii) má gestão voluntária de recursos que fomentaram sua atividade, devem ser considerados os reflexos ainda mais gravosos frutos do estado atual das coisas, especialmente os de ordem tributária; pois que se sujeitarão imediatamente ao crivo do Fisco na readequação de suas escriturações, antes formuladas como pessoa física, adaptáveis que serão – retroativamente – como jurídica e com suas profundas distinções para a situação de enquadramento anterior mais favorável.


Em conclusão, lançando mais luzes às questões de ordem tributária impactantes no processo de Recuperação Judicial, destacamos recente decisão liminar proferida pelo Ministro Luiz Fux suspendendo decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça que confirmou a possibilidade de homologação de “Plano de Recuperação Judicial (…), sem apresentação das Certidões de Regularidade Fiscal”, pois que essa estaria em desacordo com a Súmula Vinculante nº 10 [6].


Fonte: Jota 23.09.2020


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